Rio Grande do Sul

IDENTIDADE NACIONAL

Os símbolos e a nacionalidade

'Não podemos permitir que essa identidade seja sequestrada e mantida cativa por uma ideologia ou partido político'

Brasil de Fato | Porto Alegre |
"Não podemos esquecer que os símbolos nacionais, assim como as datas que celebramos, são seleções intencionais" - Foto: Lucas Martins

Todas as tradições são inventadas, já afirmou o historiador Eric Hobsbawm. Toda invenção é realizada por alguém e com algum objetivo. Os símbolos nacionais e datas festivas não são diferentes. A própria ideia de nação é uma construção histórica relativamente recente e remete à era das Revoluções burguesas que formaram os Estados nacionais modernos. Das comunidades políticas administrativas advieram a construção de histórias, culturas, símbolos, idiomas, ou seja, elementos que ajudaram a construir sentimentos de afinidades, pertencimento e identidade.

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Por muito tempo historiadores se debruçaram sobre o lado mais visível das nacionalidades e identidades nacionais como projetos de exercício de poder das elites econômicas e políticas. O objetivo era mascarar as opressões sociais, como as de classe, o racismo, a misoginia e criar um sentimento coletivo de afinidade e identidade. Contudo, os pesquisadores perceberam que, mesmo sendo um projeto potencialmente elitista, as identidades nacionais precisavam sustentar-se no reconhecimento coletivo e no sentimento de pertencimento popular.

Em outras palavras, não há nação, nem nacionalidade, sem as pessoas ou sem a cidadania. Assim, como uma comunidade política imaginada, a nação é constantemente modelada, adaptada e transformada, fundada na legitimidade da construção de solidariedades horizontais. Ou seja, na invenção de uma de uma identidade coletiva, baseada em símbolos, tradições, culturas e uma história compartilhada, assim como pelo idioma.

Contudo, as mesmas tradições e os símbolos, em si, podem passar por processos de ressignificações e transformações. Assim como a identidade nacional, ao longo da história foi apropriada e ressignificada pela cultura popular, alargando o espectro reservado pelos projetos de poder.

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Desta forma, não podemos esquecer que os símbolos nacionais, assim como as datas que celebramos, são seleções intencionais. E não podemos nos deixar levar pela versão idílica das tradições inventadas. Porém, também devemos reconhecer que esses símbolos e identidades não são imutáveis. O mais importante, não podemos permitir que essa identidade seja sequestrada e mantida cativa por uma ideologia ou partido político específico. Nem mesmo seja reduzida a símbolos esportivos periódicos. Precisamos continuar a ressignificá-los, entendendo que são, também, um campo de disputa política. E mais importante, devemos tomá-los de seu cativeiro para devolver ao seu legítimo protagonista, o povo brasileiro.

* Advogado e professor de Direito

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.


Edição: Marcelo Ferreira