Rio Grande do Sul

MEIO AMBIENTE

Assembleia gaúcha aprova projeto que flexibiliza legislação ambiental para a construção de barragens e açudes

Projeto libera intervenção em Áreas de Preservação Permanente para armazenamento de água para agricultura e pecuária

Brasil de Fato | Porto Alegre |
PL de autoria do deputado Delegado Zucco foi aprovado nesta terça-feira (12) sob críticas da oposição, que denunciou ilegalidade da proposta - Foto: Fernando Gomes/ALRS

Com 35 votos favoráveis e 13 contrários, a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul aprovou projeto de lei, nesta terça-feira (12), que altera o Código Estadual de Meio Ambiente e flexibiliza regras em Areas de Preservação Permanente (APP). De autoria do deputado Delegado Zucco (Republicanos), a legislação permite a construção de barragens e açudes no estado, a fim de garantir alternativas de armazenamento de água para agricultura e pecuária. O texto, contudo, diverge da legislação nacional.

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O autor do projeto defendeu a aprovação da permissão para intervenções em APP, que deve ocorrer quando não houverem alternativas para reserva de água. “A partir da lei, será possível aos pequenos, médios e grandes agricultores do Rio Grande do Sul, com uma alteração no Código Estadual de Meio Ambiente, tornar de utilidade pública áreas destinadas para a construção de barragens e represas. Esse é um momento histórico para a agricultura gaúcha”, declarou Delegado Zucco.

A matéria chegou a ir a plenário anteriormente, na sessão de 19 de dezembro de 2023, após ter tramitado com urgência, mas foi retirada da Ordem do Dia da sessão, por conta de divergência quanto ao tema. Nos últimos meses, o projeto recebeu apoio da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) e de outras entidades representativas.

Durante os debates sobre o projeto na votação desta terça, deputados da oposição manifestaram contrariedade à matéria. Pepe Vargas (PT) ponderou que há consenso no RS da necessidade de estabelecer uma política para reservação de recursos hídricos para consumo humano e de animais, uso industrial e na agricultura, entre outros.

"Entretanto, o projeto de lei que estamos debatendo agora não introduz uma política dessa natureza a rigor, ele procura estabelecer mudanças na legislação ambiental para permitir a reservação de água em áreas de preservação permanente", avaliou, defendendo que os deputados estaduais não poderiam fazer tal modificação sem que haja primeiro uma alteração na legislação federal.

Miguel Rossetto (PT) falou das políticas de irrigação e reservação de água desenvolvidas nos governos do PT no RS. Ele criticou a votação da matéria, lembrando que, no ano passado, houve um acordo para postergar a apreciação do texto em plenário e possibilitar o amplo debate sobre o tema. "Votar hoje este projeto significa encerrarmos este debate no estado",  valiou. O parlamentar acrescentou ainda que o projeto é claramente ilegal, manifestando seu voto contrário.

Agapan emitiu nota destacando ilegalidade

Pouco antes da tentativa de votação do projeto em dezembro, a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) emitiu nota criticando o projeto. “Em tempos de tragédias ambientais, votar um projeto que altera o regramento ambiental sem debate por si só já é algo grave. Mas, devemos colocar mais questionamentos: Quem mesmo esse projeto beneficia? Quais os possíveis impactos socioambientais? Quais os riscos da aprovação do projeto?”, questiona.

A resposta vem na sequência. “Para ficar bem esclarecido: autorização de mais desmatamento e mais barramentos particulares em cursos d’água com a finalidade de produção agrícola”, diz a entidade, pontuando que a iniciativa “busca atender a um setor mas contrariando os interesses gerais da sociedade”. Diz ainda que o PL “atende demanda dos ruralistas que, no Congresso Nacional e na Assembleia Legislativa, trabalham para descaracterizar a legislação ambiental”.

A Agapan destaca que a legislação sobre uso e intervenção em APP entra em contradição com a norma federal. “O PL conflita com o estabelecido na Lei nº 11.428/2006, que dispõe sobre a utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica, que no Art. 3º estabelece os casos de utilidade pública e interesse social, remetendo ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) definir outros casos. Portanto, a lei pretensa estadual é ilegal”, explica na nota.

Em 2018, o então presidente Michel Temer (MDB) vetou um trecho da lei que colocava as obras de irrigação como de utilidade pública. No mesmo sentido, em 2022, uma nota do Ministério Público do RS (MPRS) apontou que a legislação federal não inclui as obras e projetos de irrigação no rol das atividades consideradas como de utilidade pública e interesse social.

A direita se movimenta em Brasília para liberar a construção de reservatórios de água para projetos de irrigação em APPs à beira de rios. No final de dezembro, o Senado Federal aprovou projeto que versa sobre o tema, de autoria de Luis Carlos Heinze (PP-RS). O texto seguiu para análise da Câmara dos Deputados e ainda não foi votado.


Edição: Marcelo Ferreira