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No Paraná, aumentam as vozes críticas da sociedade contra ações violentas da Polícia Militar

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Nos bairros periféricos e áreas de ocupação, a violência, tortura e coação policial tem sido denunciada pela sociedade civil - Pedro Carrano
Organizações, parlamentares, veículos de comunicação têm denunciado a prática antipopular da PM

Jovens periféricos, pessoas negras, moradores de áreas de ocupação, de acampamentos pela reforma agrária, famílias que tiveram o filho morto pela ação da Polícia Militar sem contexto e explicações convincentes. Ações arbitrárias por parte da PM chegando até mesmo a um tapa na cara de uma pessoa jovem.

Mães e mulheres negras, lideranças em suas comunidades, vendo seus filhos criminalizados, assassinados, desaparecidos, violentados. Humilhados. O registro de casos que repercutem nas redes sociais, no Paraná e no Brasil, é praticamente diário.

Se este cenário é estrutural e se deve à formação social e econômica do Brasil, um país extremamente violento, racista, conduzido por uma elite sem projeto de país que não o investimento em presídios e empresas de segurança, é fato também o tom das críticas às ações da PM na periferia no Paraná está subindo.

Em 2023, as forças policiais do Paraná assassinaram 348 pessoas no estado. Os dados foram divulgados pelo Grupo de Atuação Especializada de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Paraná, ainda que tenha caído 28,7% em relação a 2022.

“Essa queda só foi possível porque familiares das vítimas da brutalidade policial tem se organizado cada vez mais e travam uma luta constante de denúncia e publicização da violência praticada cotidianamente nas periferias”, afirma a Rede Nenhuma Vida a Menos, que sistematiza e denúncia situações de assassinatos nas periferias, para além da justificativa protocolar do crime por “confronto”.

Resistência

Nesse sentido, em um cenário violento, a resistência também tem sido tenaz.

Organizações civis, familiares das vítimas, mandatos parlamentares, veículos de comunicação alternativos, coletivos e movimento negro, entre outros atores, têm denunciado violências, abusos e ações racistas por parte da corporação policial.

Constantemente, a campanha Despejo Zero no Paraná tem denunciado as incursões da PM, Rotam e Polícia Civil em diferentes áreas de ocupação. Como o material das casas é precário e a condição de renda das pessoas, idem, a PM muitas vezes sente-se no direito de invadir as casas e não respeitar a intimidade das pessoas, trabalhadoras, donas de casa, idosos, crianças, migrantes, trabalhadores informais e precarizados na sua maioria.

Ameaça de morte

Recentemente, incursões policiais ocorreram nas comunidades Nova Esperança, do Movimento Popular por Moradia (MPM) que está em processo de regularização fundiária, em Campo Magro, onde o policial Gabriel Thomaz Fadel teria sido assassinado. Porém, moradores acusam que tal crime – que deve ser investigado com rigor -, serviu de pretexto para abusos contra famílias trabalhadoras comuns. A mesma ação truculenta foi denunciada por entidades de direitos humanas no acampamento Reduto de Caraguata, do MST, da cidade de Paula Freitas.

Tais ações, comuns historicamente, hoje encontram mais ferramentas de repercussão com as redes sociais e generalização do uso do celular. Mais que isso, é na ação política e programática que essas questões têm sido enfrentadas. Famílias têm se mobilizado e feito atos. O mandato de Renato Freitas, na Assembleia Legislativa, têm denunciado tal situação e o deputado afirma ter sofrido inclusive ameaças de morte por isso, levando-o a acionar o Ministério dos Direitos Humanos do governo federal.

Na Câmara de Vereadores, também destaque para a vereadora Giorgia Prates, que tem levantado o tema da violência do racismo e do impacto da ação policial nas comunidades. Freitas, em particular, têm lutado por bandeiras como o uso de câmeras pelo efetivo policial, entre outros pontos de pauta.

Casos constantes

Os casos, infelizmente, se multiplicam e se repetem.

Impossível descrever todos no espaço de um artigo curto. Por exemplo, no dia 12 de março, Damião Pertile de Andrade, de 30 anos, foi morto pela Polícia Militar, em Pinhais, região metropolitana de Curitiba. No dia 17 de abril de 2021, há três anos, Willian Lucas Souza Nascimento, de 25 anos, foi morto pela PM em Ponta Grossa (PR), a poucas quadras da casa onde morava com a família.

A PM alega que houve confronto, que o jovem teria fugido de uma abordagem e trocado tiros com a polícia. Roberto Valendorff, de 27 anos, morador de Campo Magro, foi morto por agentes da Rone no dia 20 de março no Tingui. A polícia alega confronto, versão recusada por familiares – são todos casos documentados pela organização "Nenhuma Vida a menos".

Na semana recente, em ato de protesto em Piraquara, em memória pela morte de Willian Davidson, em um episódio de violência policial há três anos, a mãe do jovem afirmou o seguinte:

“Meu filho foi executado covardemente, sem confronto com os policiais e mesmo depois de já ter se rendido. Escolhemos esse horário para o ato porque foi quando ele estava sendo torturado pelos policiais e perdendo a vida”, diz.

Também nesta semana, a PM de Guarapuava - câmeras mostram - atropelaram propositalmente um morador em situação de rua.

Reformas estruturais

No plano estrutural, é fato que o Plebiscito Popular por uma Constituinte do sistema político, que recebeu 8 milhões de votos em 2014, identificava que, entre as mudanças necessárias na sociedade brasileira, está a percepção de que a Polícia Militar é uma herança da ditadura militar e deveria ser profundamente democratizada.

O impacto ideológico no interior da corporação, reforçado durante os governos Temer e Bolsonaro, somado a uma formação anti-popular, como reforça um colunista do Brasil de Fato Paraná, revela um soldado muitas vezes oriundo das camadas populares, mas treinado nos batalhões com uma visão de mundo antipovo, racista, sempre com pavor e agressividade com a "turba", e alinhada aos valores do imperialismo.

O endereço da crítica deve se dar ao governo do Paraná, conivente com tanta matança e ações de despejo, incursões em comunidades, tortura e violência, bem como à forma como a corporação é construída. Entretanto, a crítica necessária aos PMs que praticam barbaridades e violência não pode impedir a busca de diálogo com os trabalhadores sérios, alguns dos quais compõem inclusive os policiais antifascistas, preocupados com a influência do neofascismo desde a campanha eleitoral de Bolsonaro em 2018.

A possibilidade de mobilização dos policiais na base é sempre sufocada, numa categoria que não pode se organizar sindicalmente e qualquer gesto crítico direcionado ao governo pode ser considerado um crime.

Na década passada, houve mobilizações importantes das associações de praças, protagonizadas pelas suas companheiras, que fechavam os quartéis, em estados como Santa Catarina, Rio de Janeiro, entre outros.

As vozes crítica às ações de tortura, morte, violência e racismo da PM aumentam no Paraná. É fundamental transformar isso em um programa para democratização da segurança pública, retirando o conteúdo da época da ditadura militar, para que possamos acreditar numa verdadeira democracia. E a única democracia efetiva é a popular, com respeito e participação do povo.

 

*Pedro Carrano é escritor, jornalista e integrante da Frente de Organização dos Trabalhadores (FORT)

**As opiniões expressas nesse texto não representam necessariamente a posição do jornal Brasil de Fato Paraná


Tais ações, comuns historicamente, hoje encontram mais ferramentas de difusão com as redes sociais e generalização do uso do celular / Giorgia Prates

Edição: Mayala Fernandes