Rio Grande do Sul

OPINIÃO

Artigo | O lucro não deve estar acima da vida

Sob reintegração de posse, famílias da Vila Nazaré terão que participar de audiência conciliatória online em container

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Famílias da Vila Nazaré em audiência realizada em agosto de 2019 - Reprodução Facebook

A Fraport, empresa alemã que administra o Aeroporto Salgado Filho, está movendo ação de reintegração de posse contra as famílias que ainda vivem na Vila Nazaré. Por conta da ampliação da pista de pouso e decolagem, a comunidade foi removida para conjuntos habitacionais já construídos. Distantes do local de origem e dos espaços de trabalho, escolas e unidades de saúde, o que temos visto é um processo contínuo de violação de direitos humanos.

Coagidos pelo poder público e pela iniciativa privada, muitas famílias se viram obrigadas a aceitar o que lhes foi imposto, famílias que viviam há mais de 50 anos no local tratadas como ocupantes irregulares, não lhes sendo permitida a escolha ou demais opções de moradia.

Sem acesso a meios de prover a própria sobrevivência, vivenciam na atualidade a fome, o desemprego, a dificuldade de acesso às políticas públicas e equipamentos sociais, despidos de qualquer respeito e dignidade.

Agora, não bastasse a caótica situação em que se encontra o município de Porto Alegre por conta do alto índice de transmissão do coronavírus, as famílias que resistiram no local e não cederam às coações para aceitar o que lhes foi imposto, tiveram ações de reintegração de posse ajuizadas contra si pela Fraport.

Nessas ações as audiências conciliatórias presenciais foram canceladas em razão da bandeira preta no estado e as famílias agora estão sendo intimadas em tempo recorde a comparecer em audiência de conciliação on-line. Com a pretensa desfaçatez de mascarar a coação e os assédios, além de expor ainda mais às pessoas ao contágio pela covid, será disponibilizado pela FRAPORT o espaço do DEMHAB, um container com acesso à internet e técnico que possa operacionalizar o equipamento, assim como um agente municipal para prestar eventual apoio à parte numa verdadeira parceria público privada para violação de direitos.

Que justiça é essa que defende os interesses do capital internacional em detrimento daqueles que mais precisam? Que direito têm os juízes e juízas, resguardados e protegidos em seus lares, de fazer com que as pessoas que sabidamente não têm acesso à estrutura e conhecimento para acessar com segurança o sistema de suas casas, tenham que se expor ao vírus e a coação indo acessar a audiência em espaço gerido por quem lhes hostiliza?

Não nos opomos ao desenvolvimento econômico sustentável que venha a responder às necessidades humanas e sociais. Somos absolutamente contrários a toda e qualquer iniciativa que possa atentar à dignidade humana, reiterando contínuos processos de exclusão como acontecem sistematicamente nas ações de remoção e reassentamento.

Exigimos o cancelamento das audiências on-line! Uma vez que fica clara, pela celeridade com que vem sendo tratada a questão da Nazaré, certa “sintonia” com o cronograma de obras da Fraport. Que as famílias possam ter resguardados os seus direitos através de audiência presencial quando as condições de saúde pública permitirem e com os devidos esclarecimentos quanto aos seus direitos e às opções ofertadas!

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.


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Edição: Marcelo Ferreira