Rio Grande do Sul

RELIGIOSIDADE E LUTA

Jovens de todo o mundo estão a caminho de Assis para o evento Economia de Francisco e Clara

Live do BdF RS reuniu os participantes do RS para explicar os objetivos do encontro convocado pelo Papa Francisco

Brasil de Fato | Porto Alegre |
"É um evento anticapitalista", afirmam os jovens que participam de debates na Itália entre os dias 22 e 24 de setembro - Reprodução

Jovens do mundo inteiro, entre eles mais de 100 do Brasil, estão a caminho de Assis, na Itália, local onde viveram os santos católicos São Francisco e Santa Clara, para participar do evento A Economia de Francisco e Clara. O encontro, convocado pelo Papa Francisco em 2019 para ocorrer em 2020, mas que foi adiado devido à pandemia, será presencial entre os dias 22 e 24 de setembro. Visa debater a construção de um novo pacto econômico, em busca de uma economia que faz viver e não mata, inclui e não exclui, humaniza e não desumaniza, cuida da criação e não a devasta.

Neste domingo (18), o Brasil de Fato RS, a Rede Soberania e a CNBB 3 realizaram uma live que reuniu três jovens do Rio Grande do Sul que participarão do encontro em Assis, além da participação via vídeo de outro jovem, que já estava a caminho da Itália. A mediação foi da jornalista Katia Marko e do padre Edson André Cunha Thomassim, agente de Pastoral, educador popular e teatral mais conhecido como padre Edinho.

Com o tema “Papa Francisco e Jovens de Todo o Mundo para a Economia de Amanhã”, o evento vai reunir professores, pesquisadores, ativistas sociais, movimentos sociais e entidades da sociedade civil. Além do encontro com o Papa no dia 24, a programação conta com palestras e debates, com os jovens divididos por temas de interesse, chamados de vilas. As vilas trazem temas como trabalho e cuidado, economia e as mulheres, políticas para a felicidade, vida e estilo de vida, negócios e paz, negócios em transição, desigualdades, energia e pobreza, finanças e humanidades, vocação e lucro e agricultura e justiça.

Uma economia para cultivar a felicidade

Luiza Udovic Bassegio cursa Relações Internacionais e milita há alguns anos no Grito dos Excluídos Continental. Uma das escolhidas do RS para ir a Assis, ela contou ter uma história de vida de militância desde pequena junto da família na luta por justiça social. No evento, vai participar da Vila “Política para a felicidade”, que concentrará debates sobre formas de cultivar felicidade em “tempos tão difíceis para a humanidade”.

“Ninguém é feliz com fome, tenho clareza que só seremos mais felizes em uma sociedade mais equitativa, mais pacífica e economicamente mais igualitária. Por isso não pode faltar políticas públicas como saúde, educação e proteção social para nosso povo”, afirmou Luiza. Ela citou a oportunidade de encontrar jovens do Butão, país asiático que tem um sistema de avaliação do sucesso das políticas públicas baseado no FIB (Felicidade Interna Bruta) ao invés do PIB (Produto interno bruto).

Igualdade de gênero

Cristina Pereira Vieceli tem doutorado em Economia com foco na igualdade de gênero e trabalha no Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Ela também contou ter a luta contra a desigualdade presente na vida desde pequena, inclusive foi o que a motivou a cursar Economia sob uma outra abordagem.

Nos últimos anos, articulou-se o grupo “Women for Economy (Economia para mulheres), voltado para questão da igualdade de gênero, e no encontro em Assis integra a Vila “Mulheres para a economia”. Segundo ela, o foco do espaço é “pensar alternativas para tornar o mundo mais igual e que mulheres tenham mais participação na economia e na política. Como pensar essa maior inserção visando maior igualdade”.

Selecionada para participar na Academia de Francisco como bolsista de pesquisa, Cristina destacou o desenvolvimento de uma pesquisa sobre tributação e igualdade de gênero. “É extremamente relevante construir um sistema tributário voltado para a igualdade de gênero. O Brasil é um dos países com maior nível de desigualdade do mundo e a forma como o país tributa contribui para a manutenção dessa desigualdade e de gênero”, afirmou.

Experiências camponesas

Andrei Thomaz é mestre em Filosofia, membro da Pastoral da Educação e da Comissão Pastoral da Terra e compõe também a Articulação Brasileira pela Economia de Francisco e Clara, entidade que reúne os jovens brasileiros que vão ao encontro. Ele ressaltou que a inclusão do nome de Clara foi uma demanda brasileira, visto que um novo modo de economia tem de representar a caminhada de homens e mulheres.

Sua Vila será a “Agricultura e justiça”, onde vai compartilhar as experiências da Comissão Pastoral da Terra do RS e dos movimentos populares na construção de alternativas de reforma agrária popular que existem e nasceram no estado. Avalia que será uma oportunidade única para repensar o modelo econômico atual de forma coletiva, porque “nada nesse caminho foi feito sozinho”.

“Estamos indo a Assis nos encontrar para celebrar essa caminhada, a economia inspirada nesses jovens de Assis perpassa o feminino e os movimentos populares”, afirmou, destacando a caminhada franciscana que no Brasil já está há algum tempo com a proposta de economia feminina.

O engenheiro e empresário Tiago Guerra não participou ao vivo por já estar em deslocamento para o encontro. Em vídeo, ele disse que o Papa Francisco foi muito feliz ao convocar jovens de todo o mundo para essa discussão de novos modelos econômicos mundiais em uma perspectiva da diversidade. “Não há como avançar sem uma escuta ativa a todas as partes e todas as pessoas”, disse.

“A palavra economia remete a cuidado com a casa comum e é importante ter esse olhar, muitas empresas e economias mundo afora demonstram não ter cuidado com nossa casa comum”, comentou. Tiago lembrou que São Francisco não é apenas padroeiro dos animais, “mas de forma mais profunda, a gente vê o quanto sua história é inspiradora e quanto ele desenvolveu um trabalho para manutenção de um bem-estar coletivo”.

Um evento anticapitalista

Provocados por padre Edinho, em comum acordo os jovens afirmaram que o processo que está ocorrendo em Assis é um projeto anticapitalista. “A gente precisa de um modelo econômico que coloque em xeque o capitalismo e esse neoliberalismo que cria uma economia que mata”, afirmou Luiza, destacando a necessidade de encontrar uma economia que” supra todas as necessidades dos seres humanos”.

Para Cristina, o evento é uma crítica ao capitalismo em sua frase neoliberal. “Sistema que constrói a ideia de que você por si só como individuo consegue, essa coisa da ideologia da meritocracia, que você consegue tudo sozinho, e que a gente socialmente não deveria se organizar. A força como o sistema neoliberal se constitui é totalmente individualista, a partir de ideia de indivíduo racional que vai definir suas escolhas a partir da obtenção de mais lucro e esse lucro em cima dos outros, inclusive destruindo a natureza e formas de solidariedade.”

Andrei recordou que Francisco de Assis é anticapitalista, pois abdicou da riqueza de sua família porque “não queria mais servir ao senhorio dos feudais, mas a Deus”. “A economia da partilha é anticapitalista. Enquanto existir um sistema que lucra às custas dos pobres nós seremos contra esse sistema e ensaiaremos modos de bem-viver diferentes dele, mesmo que vá aos trancos e barrancos, aos tropeços, mas sem nunca perder o horizonte e a utopia de um mundo comum”, finalizou.

Assista à live completa:


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Edição: Katia Marko