Rio Grande do Sul

SOCIOEDUCAÇÃO

Após motim em unidade da FASE, instituições entram em acordo para melhorias no atendimento

Defensoria Pública do RS ingressa com ação civil contra a emissora BAND por veicular imagens dos adolescentes

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Motim ocorreu no dia 16 de junho na unidade Comunidade Socioeducativa (CSE) da Fundação de Atendimento Sócio-Educativo (FASE/RS) - Foto: Reprodução

Um motim ocorrido no dia 16 de junho na unidade Comunidade Socioeducativa (CSE) da Fundação de Atendimento Sócio-Educativo (FASE/RS) deixou agentes feridos. No dia anterior. a juíza de Direito Karla Aveline de Oliveira fez uma inspeção na referida unidade. Conforme salientam a magistrada e o presidente da Fase, José Stédile, o que aconteceu na última sexta-feira, trata-se de um episódio pontual e foi resolvido entre as partes. 

Caso obteve repercussão essa semana quando a Rádio e Televisão Bandeirantes S/A (BAND) divulgou nesta quarta-feira (21), no programa Boa Tarde RS, vídeo com imagens dos socioeducandos internados na Unidade CSE da Vila Cruzeiro, em rede de televisão, intitulado “Novas imagens de rebelião na FASE”, onde aparecem os rostos dos adolescentes. Posteriormente, veiculou o vídeo no seu canal Band/RS no YouTube.

O apresentador do programa, Alexandre Mota, referiu, durante a apresentação da “reportagem” com a veiculação do vídeo, estar desobrigado a informar a fonte das imagens, que, segundo ele, recebeu no dia 21.06.2023, no turno da manhã, destacando, ainda, a importância das imagens porque “mostram a cara deles”, “mostram quem são os agressores (...)”, “menores vagabundos”, “coitadinhos”, “vítimas da sociedade”, “menores bandidos”, “delinquentes”, “sementinhas do mal” etc. A Defensoria Pública do Estado do RS entrou com ação civil pública contra a emissora. O processo aguarda decisão.

Em nota, o Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas e de Fundações Estaduais do Rio Grande do Sul (Semapi RS) destacou que o motim deixou cinco trabalhadores e trabalhadoras da Fundação feridos. “Este é o segundo caso de agressão a trabalhadores e trabalhadoras da FASE em 15 dias. No dia 30 de maio, um colega foi brutalmente atacado e levado ao Hospital de Pronto Socorro da Capital, onde passou por cirurgias. As situações apenas ressaltam o clima de instabilidade e insegurança nas unidades da Fundação, denunciado recorrentemente pelo Semapi, destaca o sindicato.

Presidente da FASE diz que segurança é prioridade

Conforme salienta o presidente da FASE, José Stédile, a segurança e o bem-estar dos socioeducandos e dos socioeducadores é prioridade para a instituição. “O fato de sexta é um episódio pontual que está sendo tratado com o devido cuidado por parte da nossa direção-geral. O trabalho seguirá priorizando a defesa da vida dos adolescentes e dos nossos servidores”, disse. 

Ele também pontua que a gestão está prestando o atendimento sócio-funcional aos servidores, como previsto dentro do trabalho pós-crise. “Estamos trabalhando para intensificar a segurança em todas as unidades”, completou, citando que a Diretoria de Qualificação Profissional e Cidadania (DQPC) está reforçando os plantões na unidade.

A diretoria Socioeducativa (DSE), por sua vez, intensificou ainda mais o acompanhamento das rotinas da CSE desde o ocorrido na última sexta-feira. A atuação é compartilhada com as equipes da Coordenação de Medidas Socioeducativas e com o Núcleo de Segurança. “O trabalho buscou reorganizar as ações e a retomada da rotina da casa o mais breve possível. Seguiremos trabalhando para garantir a segurança institucional em todas as nossas estruturas”, concluiu o presidente.

A juíza Karla Aveline também ressalta o caráter episódico. “Um dia antes do motim, nós fizemos uma inspeção judicial. A diretora disse que os chefes de equipe estavam atentos, já tinham notícias de que alguns meninos pretendiam fugir e fazer reféns, então eles estavam atentos a isso", expõe. 

Segundo pontua a magistrada, a CSE é uma unidade que recebe meninos com perfil agravado. “Então eles têm que ter uma maior preocupação. E os agentes souberam resolver bem a situação, cumprindo o que está no plano de contingência da unidade. A gente só tem a reconhecer a excelência no tratamento dos agentes diante dessa situação crítica. E no geral, as unidades têm apresentado uma significativa melhora, assim, em várias questões que foram pontuadas nas inspeções ou que a gente escutou nas audiências concentradas”, detalha. 

"Diretorias têm feito esforço para atender as demandas do Judiciário”, afirma juíza

Karla aponta que as direções estão mais atentas a essas questões que estão sendo pontuadas. De acordo com ela, hoje há várias unidades de Porto Alegre que estão atendendo o programa da Sócio Educação e que estão muito bem. “Eventualmente, acontecem alguns casos episódicos também de afastamento de servidores sujeitos a recurso, sujeitos a contestação, a apresentar defesa, etc e tal. São questões bem pontuais que não dizem realmente do trabalho desenvolvido pelos agentes ou pelo esforço que as diretorias têm feito para atender as demandas do Judiciário”, afirma. 

De acordo com o defensor público Rodolfo Lorea Malhão, a Defensoria Pública entende que o ocorrido foi satisfatoriamente controlado pela CSE, assegurando sem quaisquer danos os direitos dos adolescentes. Segundo o defensor, a unidade CSE está adequada ao melhor tratamento aos jovens. Contudo, pontua que acabe à Administração da FASE elaborar planejamento e projetos continuados de profissionalização, oficinas terapêuticas e pedagógicas.

“A falta de atividades é nociva ao melhor cumprimento da medida socioeducativa pelos adolescentes e acaba abrindo espaço para criarem-se ambientes de violência e agressividade. A título de exemplo, a FASE possui uma cozinha industrial inteiramente montada com recursos públicos que está totalmente inutilizada, enquanto os adolescentes da CSE não fazem nenhum curso de profissionalização. Em acordo judicial, foi acertado plano de utilização da cozinha industrial, mas a sua utilização foi novamente interrompida”, expõe. 

Na decisão expedida pela juíza Karla, no dia 19 deste mês, ela destaca que "na inspeção realizada no dia 15 deste mês, foram ouvidos adolescentes, técnicos, direção e percebidas diversas questões que se prolongam no tempo e que prejudicam sobremaneira o processo socioeducativo, a totalidade delas que não diz respeito, diretamente, à forma de administração da Diretoria da unidade CSE". 

O documento pontua, por exemplo, a ausência de curso profissionalizante e oficinas. “Como até as pedras sabem, não há curso profissionalizante em nenhuma das unidades da FASE de Porto Alegre. Tal circunstância é gravíssima, vem sendo tratada em diversas reuniões, faz anos, inclusive tramita ação judicial sobre o tema no outro Juizado. Enquanto isso, adolescentes não têm seus direitos garantidos", expõe.


Edição: Katia Marko