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Coluna

Temos que nos posicionar

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Frente ao discurso de Lula e o que ocasionou, nós, da coluna Diálogos Feministas, decidimos nos posicionar - Reprodução Instagram mundano_sp
Nos solidarizamos com Lula e sua fala corajosa em tempos de genocídio e atrocidades

Frente ao discurso de Lula e o que ocasionou, nós, da coluna Diálogos Feministas, decidimos nos posicionar.

Eu sou mariam pessah, sou judia, e já disse muitas vezes o quanto sou contra o genocídio que está acontecendo em Gaza. Para quem não leu, tem muitas das nossas colunas falando e denunciando isso que não é uma guerra, mas um massacre

Ao ouvir as palavras do nosso Presidente, fiquei muito feliz com o seu posicionamento. Eu e quase toda a esquerda, embora este seja um tema divisor de águas. Muitas pessoas sionistas que normalmente votam à esquerda, neste ponto não coincidem. Precisamos nos posicionar porque, neste momento, as direitas e ultradireitas estão querendo a cabeça de nosso pres(id)ente, qualquer palavra que eles considerem a mais será motivo de mobilização para o impeachment.

Se esteve bem ou mal a comparação entre Netanyahu e Hitler, será a história que o dirá, agora não podemos perder o foco. Temos como presidente um dos maiores líderes mundiais e um dos poucos, no mundo, a se posicionar tão categoricamente pelo cessar-fogo imediato. As palavras de Lula caíram como uma luva em noite de inverno, pois nesta quinta-feira Bolsonaro, genocida e íntimo do primeiro-ministro do Estado de Israel, prestou depoimento. E são muitas as provas contra ele, é muito grande a vontade deles de mudar o rumo e distrair as pessoas.

Sou Claudia Santos, da Frente Gaúcha de Solidariedade ao Povo Palestino. Lula foi gigante ao afirmar que o que ocorre em Gaza é uma guerra de um exército contra mulheres e crianças, que Hitler cometeu as mesmas atrocidades utilizando seu exército contra civis judeus, e rompendo diplomaticamente com Netanyahu e sua ocupação militar ilegal. Acertou muito ao enfrentar a opinião pública fazendo uma fala que exige o reconhecimento do Estado Palestino e o fim do genocídio, este que os povos do mundo já vêm denunciando em manifestações de milhões de pessoas nas ruas, gritando contra o apartheid e pela Palestina livre do rio ao mar.

Desdobramos as afirmações de Lula com dados dos acontecimentos de outubro de 2023 para cá, embora saibamos que a opressão do povo palestino começou há mais de 76 anos. O Ministério da Saúde de Gaza divulgou dados atualizados do genocídio: os assassinatos do exército israelense na região totalizam 29.313, dos quais 12.300 são de crianças e 8.300 são de mulheres, portanto um exército que tem como principal alvo mulheres, crianças e bebês.

Gaza mesmo, nada mais é que o maior campo de concentração já existente. Onde 2,3 milhões de palestinos e palestinas estão confinados para morrer. Enquanto aguardam a sua morte, servem de cobaias para testes de armas, mísseis, drones assassinos, substâncias químicas e tecnologias de vigilância e controle, às quais são vendidas mundo afora com o selo de testadas em campo. Bombardeios ocorrem sem interrupção há mais de 16 anos, a conta-gotas ou mais intensivamente como ocorreram em 2008, 2012, 2014 e 2018 e 2021.

Quando não são tão intensos, a um pequeno percentual de palestinos e palestinas de Gaza é permitido atravessar os muros controlados militarmente para trabalhar por salários baixíssimos. Porém, esse trabalho é forçado porque as palestinas e os palestinos não têm outra escolha a não ser trabalhar para quem está matando seus filhos e entes queridos, roubou suas terras e ainda está avançando os assentamentos e destruindo aldeias palestinas, demolindo casas cotidianamente.

No mesmo dia da importante fala do presidente Lula, saiu um relatório da ONU demonstrando que as mulheres e as meninas sofrem abusos severos em Gaza e na Cisjordânia, dentre os quais: a execução sumária de mulheres e meninas, muitas vezes junto aos seus familiares enquanto buscam refúgio; o sequestro de mulheres e meninas, incluindo trabalhadoras humanitárias, ativistas de direitos humanos e jornalistas, sofrendo tortura nos cativeiros israelenses, espancamentos, estupros, imposição de nudez e revistas vexatórias, e exposição online de fotos e vídeos das mulheres e meninas palestinas nessas condições; e restrição severa de alimentos, medicamentos e absorventes. Muitas crianças foram afastadas de seus pais e capturadas pelo exército sionista, sendo seus paradeiros desconhecidos, confirmando que os alvos dos soldados de uma das maiores potências bélicas no mundo são, portanto, as mulheres e meninas palestinas.

Nos solidarizamos com Lula e sua fala corajosa em tempos de genocídio e atrocidades, essa fala nos traz esperanças. Lula tem influência no campo internacional e pode fazer com que os países do Sul global sigam seu exemplo e rompam relações diplomáticas com o estado de apartheid. A certeza da importância, no cenário internacional, do posicionamento corajoso de Lula também nos faz, mais uma vez, solicitar que se expulse o embaixador israelense do solo brasileiro, pois não queremos genocidas em nosso país, também conclamando para que se encerre todas as relações entre Brasil e “Israel”, principalmente as militares e da área de segurança.

Uma vez, constatado o genocídio, não há mais porque deixar recursos dos cofres públicos brasileiros serem destinados à compra de armas e tecnologias de necropolítica e apartheid, que são as vidas palestinas, cotidianamente, e também nas comunidades do Brasil, nos territórios indígenas e quilombolas e que servem para o extermínio do povo negro, assassinatos de defensores dos direitos humanos no Brasil e repressão dos movimentos sociais. O rompimento do governo brasileiro com esse Estado Terrorista poderá acarretar o fim do genocídio do povo palestino e no cessar-fogo permanente, pela influência que nosso governo tem hoje no cenário internacional.

Sou Lara Werner Yamaguchi, sanitarista, neta de imigrantes refugiados da bomba atômica, e a magnitude da declaração de Lula deve repercutir de maneira catalisadora sobre as pautas de consolidação das democracias participativas. Reconhecer um dos genocídios em curso no mundo significa a capacidade e obrigação moral e institucional de nomear as violências que ocorrem em território brasileiro e latino-americano.

Após a declaração de Lula, somou-se Gustavo Petro, presidente colombiano historicamente eleito, e posicionamentos definidos quanto ao genocídio em Gaza devem ter o efeito, em escala global, do que foram as recentes e polarizadas eleições tanto no Brasil quanto Argentina.

À medida que vamos experienciando as estratégias da extrema direita global para a implosão dos traços democráticos de governança e cidadania, vão se descortinando os esquemas da íntima relação entre Estados, multinacionais, milícias e redes internacionais criminosas. A máquina de guerra do século 21 se chama neoliberalismo e o que resulta desses grandes acontecimentos necroestruturais, sabemos, são intensos processos de deslocamento humano.

A resposta mais coerente a esse cenário é a implementação de políticas de bem-estar social capazes de absorver as demandas plurais e também comuns das diversas comunidades em seus territórios. A violência que sofre um trabalhador negro em Porto Alegre, por exemplo, é da mesma natureza daquela sofrida por um/a trabalhador/a palestino/a na Gaza sitiada por Israel sionista, e isso precisa tanto nos assustar quanto nos mover.

Como trabalhadora da Saúde, já testemunhei atuações violentas da Brigada Militar contra mulheres vítimas de violência que poderiam ser narradas por mulheres palestinas. Para além das declarações e câmeras instaladas nas fardas, o controle social difuso tem se mostrado uma ferramenta potente e interpeladora, desde baixo, das instituições. Herdamos as violências coloniais, há de se aprender como deserdá-las.

* Este é um artigo de opinião. A visão das autoras não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato. 

Edição: Katia Marko