Vim para Poa em maio de 1970. A ditadura estava em pleno vigor. Denúncias políticas geravam perseguições policiais; grupos de resistência armada, acuados, ainda atuavam; prisões, tortura, repressão, controle sobre os sindicatos, cassações, censura. Eu, bancário, logo estaria envolvido nas lutas da minha categoria e da intersindical. Soube da existência de um teatro pequeno, barato, no centro da cidade. Era o Teatro de Arena que, mesmo sob severa vigilância e censura, conseguia apresentar peças de resistência. Passei a frequenta-lo.
:: Teatro de Arena, uma experiencia de resistência ::
Lá conheci o Jairo Andrade e sua Cia. Depois do expediente no banco, pegava um ônibus na Assis Brasil, desembarcava no Mercado, subia a Borges de Medeiros, suas escadarias, atravessava a Duque de Caxias e chegava no Arena para assistir peças como Os Fuzis da Senhora Carrar, Arena conta Zumbi, Muro de Arrimo, Eles não usam blacktie, Jornada de um imbecil até o entedimento, Mockintoch... Mais tarde levamos Muro de Arrimo para ser apresentada, por várias sessões, no salão do SeebPoa, no prédio do Cinema Cacique, 11° andar.
Tomei conhecimento e consciência de coisas ainda fora do meu universo. Muitas vezes vi o Jairo Andrade e sua equipe trabalhando como marceneiros, carpinteiros, pedreiros, costureiras e pintores na montagem dos cenários e das peças que eles mesmos iriam representar. Aprendi muito com as peças que assisti no Arena e observando o trabalho coletivo do Jairo e seus companheiros(as).
Com o Jairo Andrade, agora falecido, continuo me emocionando e aprendendo. Era um lutador cultural, para quem a Arte não poderia ser um enfeite, um adereço mas um múltiplo e desafiador embate no palco da vida pela afirmação da dignidade humana. A Cultura e o Teatro do RS perdem um especial e valoroso criador.
Pêsames aos seus prezados familiares e amigos(as).
* Ex-deputado Constituinte, ex-prefeito de Porto Alegre e ex-governador do RS
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Marcelo Ferreira